Em meu primeiro dia de aula na faculdade, a professora de Sociologia entrou na classe e disse: “Estou aqui e sou paga para destruir todas as certezas que vocês acumularam até agora! A partir de hoje, suas dúvidas acerca de muitas coisas aumentarão!”. E ela cumpriu o que disse.
Pra quem pensava que, ao entrar na faculdade, você aprende a ter certezas de muitas coisas, e com isso, fica em vantagem intelectual acima da média das pessoas, as aulas daquela professora foi sempre um “soco no estômago”, ou melhor, no cérebro. Ao final de suas aulas a maioria de nós estava indignada com o desmoronamento que ela causava em nossas muitas certezas acerca daquilo que havíamos tido até então. Eu como um bom protestante evangélico e tendo nascido e sido educado no final da ditadura militar, vendo minha fé se ruindo em muitos personagens da história brasileira, meus muitos mitos e fantasias foram se desmoronando um por um; fui reclamar para a professora de Filosofia, sabendo que ela era uma boa católica e então ela disse: “Reinaldo, no mundo acadêmico não se misturam as coisas, o que a professora de Sociologia está fazendo é uma coisas saudável para sua mente (principalmente se você acreditava em muitas mentiras). Sua mente só poderá assimilar mais conhecimento e informação se sua estrutura mental antiga for destruída e ampliada. É necessário que isso aconteça para que você continue crescendo como estudante e como pessoa!”.
Hoje sou grato àquela professora de Sociologia, pois num certo sentido, ela trouxe pra mim “libertação” das minhas antigas e esclerosadas crenças. Libertou-me dos meus mitos e dos meus medos. Posso pensar com mais nitidez e inclusive analisar e questionar as coisas. Em outras palavras, sou livre para pensar e escolher no que quero crer.
Não preciso mais viver resignado, “engolindo sapo” e decepcionado com coisas ou pessoas. Tenho o pé no chão e prefiro viver com minhas próprias pernas, mesmo que seja tropeçando ou caindo às vezes. É a diferença de um banzai que se muda para qualquer lugar que se queira, de uma figueira, tipo aquela que está plantada na praça central de Florianópolis e que cuja imensa copa cobre metade da praça tendo que ser acompanhanda com escoras de ferro seus galhos e seus ramos. Imponente e majestosa. Ninguém a remove de lá!
O interessante é que eu encontro esse tipo de didática divina na bíblia.
Ele vem caminhando sobre as águas, quando os discípulos tinham “certeza” que ele vinha remando num barquinho. Ele demora mais no lugar onde está quando os discípulos tinham “certeza” que ele ia sair correndo para acudir Lázaro que estava doente. Ele prefere apostar nas dúvidas do incoerente Jó do que nas “certezas” religiosas de seus amigos. Ele manda o capitão Naamã pular sete vezes no rio Jordão, quando o capitão tinha “certeza” que o profeta ia apenas impor as mãos. Ele prefere acreditar na fé vacilante do centurião romano do que na religiosidade farisaica. Os exemplos são quase inumeráveis...
A dúvida não é o oposto da fé. E sim o medo. E Deus quer nos libertar dos medos. É nos momentos de incertezas que confiamos em Deus. E ele é a nossa única certeza. Esta é a diferença do Jesus do Evangelho do jesus da religião. O Jesus do Evangelho não é fixo. Não é previsível. Não é pontual. Não atende com hora marcada. Não tem agenda. Não tem dia. Não tem altar. Não tem geografia. É gostoso viver num mundo de certezas. Certezas geram segurança. E segurança gera conforto e comodismo. Talvez, esta seja uma das características mais gritante da religião. A religião nos dá muitas certezas acerca do mundo de Deus e do mundo, supostamente, espiritual. Estando certo acerca do que o “deus” religioso quer, então é só satisfazê-lo que está tudo certo.
Está tudo garantido. É preto no branco.
Um comentário:
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